Edson Vidal

E o Necrológico?

Como faz falto um jornal na República de Curitiba, disse jornal com varias cadernos, mil propagandas, dez por cento de notícias amanhecidas e comentários de jornalistas atolados no lodo imundo da ideologia.

Sabe, aquele jornal que tem espaço para umas notas sem muita utilidade, fotos de jogadores de futebol, coluna de protestos, editorial meia boca, compra e venda de qualquer coisa, horóscopo, charge, palavras cruzadas e receitas culinárias. Como era bom ler a “Gazeta do Povo” do Dr. Francisco, tinha de tudo um pouco, até notas políticas falando bem do Aníbal e da sua turma de amigos.

E o Dino de Almeida? Falando de tudo e de todos que frequentavam como figurinhas carimbadas a sociedade curitibana e participavam da “Garota Caiobá”, a festa anual do nosso litoral que promovia a “Divina”. Depois que o Dino se foi até Caiobá murchou. Também era gostoso ler a d. Juril que ocupava uma página inteira para promover nomes de pessoas e suas festas maravilhosas. Era imperdível ler o Mazza com suas surpresas e comentários bem articulados sobre a política. Às vezes o que ele escrevia incomodava muita gente.

E as “Entrelinhas”? Era um mosaico de colagem como bugigangas que as pessoas penduravam nas paredes de madeira de suas garagens. Só que eram notas telegráficas dos mais variados temas. E o necrológico então? Bastava à pessoa morrer que seu nome constava na mesma hora do espaço mais lido pelos leitores, embora muitos negassem que liam para não serem lembrados. Ninguém batia a “Gazeta” nesse item; o concorrente mais próximo era o Artur de Souza, no programa “Revista Matinal” da Rádio Clube Paranaense, que noticiava todo dia pela manhã o rol dos falecidos.

Lembro que uma tia de minha mulher, pessoa de idade provecta, quando tomava café da manhã, já estava com a bolsa à tiracolo, ansiosa para ouvir o necrológico. Quando o apresentador terminava de anunciar os falecidos do dia e os locais dos respectivos velórios, ela era a primeira a cumprir o doloroso papel de prantear alguém.

Sempre um da relação era  seu conhecido ou amigo que partiu desta para algum lugar. Hoje a velha e tradicional “Gazeta do Povo” mantém apenas o nome através de um mundo eletrônico de nenhum manuseio, ou pelo “pastelão” dos finais de semana que mais parece um conjunto de folhas para embrulhar mercadorias de grande volume. Há pessoas que gostam afinal mau gosto não se discute. E pensar que até a cidade de Londrina tem o seu jornal com mil utilidades para a região do norte do Paraná. E o curitibano de idade mais avançada e acostumada a ler o seu jornal diário, para não ficar chupando o dedo, se obriga a ser assinante de qualquer jornal de São Paulo. Uma tonelada de papéis de puro bairrismo. Nem uma só linha de Curitiba, como exceção quando noticiam sobre o processo da Lava Jato.

E só! A gente nem sabe mais quem morreu na véspera. Dias atrás telefonei para a casa de um amigo, que eu sabia por intermédio de terceiros que ele estava doente, e quem atendeu foi à empregada da casa:
- Alô, pois não.
- Bom dia é a dona Dalila?
- Não, senhor. É a empregada...
- Por favor, posso falar com o Ambrósio?
- Não senhor.
- Por quê?
- Faz mais de um mês que ele morreu...

Desliguei o telefone, sem graça e sem me identificar. 
Tudo por que falta um mísero jornal diário que noticie os acontecimentos diários dos fatos e das pessoas de nossa terra.

Que falta de empreendedorismo, gente! Com certeza a tia de minha mulher, se estivesse viva, para não perder o seu hábito de frequentar velórios de seus conhecidos, com certeza, estaria endividada de tanto viajar para São Paulo. Pois atualmente a gente só sabe de quem morreu na Pauliceia desvairada, através dos jornais de lá.

Acho que pelo costume adquirido ao longo de toda a sua vida, ela nem se importaria que o falecido lhe fosse totalmente desconhecido. É como eu: não me importo com o nome do jornal, mas do tamanho dele para manuseá-lo com o prazer de antigamente...

“Não sobrou nenhum jornal minimamente razoável para o leitor curitibano. Sabe, aquele pasquim que não diz muita coisa, mas que pesava uma tonelada. O prazer estava em folhear suas páginas e ler de soslaio o necrológico!”
Edson Vidal Pinto

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