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Mensalão utilizou
teoria jurídica de
forma equivocada
O
julgamento do chamado Mensalão ainda repercute na vida política brasileira. En-
tretanto, ele foi baseado em vários momentos numa teoria jurídica que ganhou
com isso notoriedade no país, a Teoria do Domínio do Fato, do alemão Claus Ro-
xin, utilizada de forma equivocada. Os erros são apontados por juristas brasileiros que
agora estão lançando no Brasil o livro “Autoria como domínio do fato”, pela editora Mar-
cial Pons. A obra foi escrita por Alaor Leite, Luís Greco, Adriano Teixeira e Augusto Assis,
que atuam com Roxin na Alemanha. O mestre alemão é considerado por muitos o crimi-
nalista mais infuente da atualidade. A Ações Legais conversou com o jurista Alaor Leite
sobre a obra. Confra:
Ações Legais - De que forma o livro “Autoria como domínio do fato” vem esclarecer o uso
da Teoria do Domínio do Fato no chamado Mensalão?
Alaor Leite
- O livro contém uma crítica minuciosa a respeito do uso da teoria do domínio
do fato na Ação Penal 470/STF, o “caso mensalão”. Muito se falou sobre os equívocos na
aplicação da teoria: o livro demonstra em detalhes quais foram esses equívocos de na-
tureza técnica. O julgamento do “mensalão”, em verdade, reproduziu, em maior escala,
alguns equívocos que já rondavam as decisões judiciais de outros tribunais brasileiros. De
todo o modo, o destaque que se deu ao caso e o alto grau de nossa Corte Constitucional
podem conduzir à perpetuação desses equívocos. O livro, a partir do escrutínio crítico,
quer evitar essa perpetuação e apontar para os caminhos corretos.
Ações Legais - No livro, um capítulo é dedicado à crítica à reforma do Código Penal Brasi-
leiro. Pode explicar seu ponto de vista a respeito?
Alaor Leite
- O projeto de novo Código Penal (PLS 236/2012) é, do começo ao fm, impres-
tável. A crítica científca já demonstrou ponto por ponto quais são os disparates técnicos
contidos no projeto. Em breve, sairá outro livro organizado por mim e que conta com a
participação de vários dos grandes criminalistas do Brasil (Reforma penal: A crítica cientí-
fca à Parte Geral do Projeto de novo Código Penal, Editora Atlas, São Paulo, 2014) no qual
toda a crítica científca está documentada. O projeto caminha a velocidade lancinante,
ignorou e ignora a ciência jurídica brasileira e visa a alterar dispositivos técnicos sem ouvir
os técnicos, a partir de uma racionalidade puramente pragmática - seria como reformar
um hospital sem ouvir os médicos. No livro “Autoria como domínio do fato” há uma crí-
tica detalhada sobre os artigos do projeto que tratam da autoria e da participação, e que
tentaram adotar, de forma atabalhoada, a teoria do domínio do fato. O que fzeram, to-
davia, foi - tal como ocorrera com a jurisprudência - usurpar o nome da teoria do domínio
do fato, e só. A solução que apresentam é pura invenção de um legislador atécnico. Caso
esse projeto entre em vigor, será a maior tragédia legislativa de nossa história republica-
na em matéria penal.